Conversações em tempos de pandemia (Parte I)

PARTE I - 22 de abril de 2020
Vanessa Miranda
Como será que nós estamos nesse período? Eventualmente nos perguntamos e quase sempre respondemos que estamos bem, dando um jeito, encontrando formas de lidar com esse momento, buscando leituras, filmes, videochamadas, enfim, criando estratégias. Talvez como se fosse possível criar mundos e realidades semi-alternativas em que os impactos dessa quarentena não sejam sentidos e vividos com muita intensidade. Acredito que uma parte das pessoas está até conseguindo fazê-lo, principalmente aquelas que seguem trabalhando. Eu me questiono sobre as pausas da cotidianidade, sobre a liberdade de ir e vir, sobre a importância do se apresentar socialmente, sabe? Isso de se arrumar pra sair, ter que passar em dois, três lugares e resolver pequenas coisas para trabalhar ou para levar pra uma reunião social ou para organizar o trabalho. Essas coisas pequenas que tem feito falta. Uma reflexão sobre as faltas, sobre um certo saudosismo, sobre um cenário que não estamos podendo viver. O que será isso, afinal?
Mávila Andrade
Algo relacionado a rotina? A rotina nos organiza, faz com que as nossas ações tenham sentido e utilidade, talvez esse seja o motivo das pessoas que mantêm o trabalho em home office estarem conseguindo encontrar recursos para seguir. A manutenção das atividades consideradas “úteis” em uma sociedade capitalista nos oferta o sentimento de pertencimento e participação. Ao pararmos e nos encontrarmos em uma condição tão peculiar para quase todos nós, faz com que seja ainda mais pesaroso a não rotina, a não saída para o trabalho, a ida rápida ao mercado ou o passeio no shopping. Agora estamos sendo convidados a viver o(s) silêncio(s), o silêncio das grandes avenidas sem os sons dos carros, o silêncio da não interação com o outro, o silêncio das certezas e, o que talvez será a nossa bóia de salvação diante de tantas mudanças, o nosso silêncio. Entendo que o nosso silêncio permitirá a reflexão e a revisão, nele emergiremos em diálogos internos com nós mesmos, tentando construir as nossas versões preferidas, tentando compreender o impacto dessa pandemia nas nossas vidas, na vida de quem está próximo a nós, da nossa comunidade e do mundo.
Viviane Resende
Quando escuto o meu silêncio, me conecto com muitos diálogos. Essa semana, em um atendimento, um paciente contou que, após desligar a videochamada com os amigos, sentiu uma sensação de vazio. Mas vazio de que? Depois de pensar um pouco, ele disse: “de pessoas”. Vazio de poder tocá-las, abraçá-las, olhar nos olhos sem uma tela intermediando. “Não é exatamente saudade, sabe?”, ele disse, mas faltam os aspectos da interação física. É isso, faltam pessoas. Pessoas conhecidas ou não. Faltam as trocas de bom dia nos elevadores, faltam as conversas nos corredores e recepções. Faltam aqueles diálogos tão “supérfluos” (seriam eles tão supérfluos assim?) sobre o clima, de como Salvador é assim tão imprevisível. Ah, mas o imprevisível… esse sim ainda se faz presente.
Fernanda Alves
Pois então, venho pensando como pra mim, se representa o imprevisível. Entendo que o convite do tempo que criamos para manter o pseudo-controle do nosso cotidiano é descartável quando opero no instante. No aqui e agora a discussão sobre previsibilidade se esvai. E vivendo no agora o chamado é para reverenciar o que nos conecta uns com os outros, ao que é imprescindível: a presença. Estamos descobrindo as virtudes da virtualidade ao mesmo instante que mantemos a sensibilidade do contato físico, do toque ou do simples gesto de cumprimentar com um “olá”, o que gera, no mínimo, sentimentos de ambivalências que provocam sensações difíceis de nomear. O que é mesmo que se passa? Vai passar? E o que virá? Não sabemos, são muitos questionamentos, mas com cada nascer do sol, surgem brilhos que mantém aceso nossos feixes de esperança para um novo amanhã.