À Mesa com Mony
Éramos quatro ali sentados naquela mesa e nos bastávamos. O cenário tinha um frescor deslumbrante de uma pequena aldeia em Montpellier, no sul da França, que nos ofertava a deliciosa prática de desfrutar de um bom vinho. Optei pelo Rosé e eles três por um corpulento vinho tinto. O sabor do momento, o sabor do saber de repente foi interrompido quando um garçom atrapalhado irrita Mony que, intolerante com a dificuldade daquele pobre garçom em compreender o seu pedido, levanta e quebra o momento sublime com uma certa amargura curtida pelo tempo. Alí víamos a dupla experiência do tempo: o tempo cronológico, linear, onde os eventos podem ocorrer de forma despercebida, e o tempo do mergulho, da pausa e da reflexão que podem conter o entusiasmo de quem se apaixona pela vida. A arte do envelhecer me oferecia uma cena da qual desfrutava como espectadora não só de um vinho curtido no tempo, mas de três mestres que aplicavam à mesa a sabedoria ou a intolerância da idade. Pensarmos na dimensão futura como algo desbravador e entusiasta significa reconhecer um presente pautado no gozo e na satisfação de quem gosta de ser quem é. Quando o presente nos garante autonomia e segurança de desfrutá-lo, o futuro nada mais é do que a emoção projetada de um prazer atual. O que nos leva a escolher envelhecer com os azedumes e as amarguras do tempo colecionando apenas as histórias infrutíferas que nos reduzem ou apreciar os recortes de vida que nos eleva a uma dimensão sublime do que podemos chegar a ser? Escolhas. Escolhas que nunca deixaram de estar em nossas mãos, que sempre ali estiveram para que pudéssemos pinçá-las com o que de melhor podemos oferecer ou com as nossas partes sombrias que muitas vezes nos reduzem e nos desmerecem. Que o tempo me conceda a sabedoria dos mestres, que o tempo me faça reconhecer o melhor de mim, o melhor do outro, as melhores cenas para que o meu repertório de vida valha a pena.
Conto terapêutico escrito por Nina Guimarães Diretora do Instituto Humanitas